A Justiça Federal na Paraíba autorizou que a Associação Brasileira de Apoio Cannabis Esperança (ABRACE), em João Pessoa, mantenha o cultivo e a manipulação da maconha para fins exclusivamente medicinais.
A autorização surgiu por meio de uma liminar até a obtenção da resposta definitiva da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A permissão é destinada somente para atender os 151 pacientes associados ou dependentes dos associados da ABRACE, listados no processo.
A decisão foi da juíza federal da 2ª Vara, Wanessa Figueiredo dos Santos Lima. Mas, ela determinou também que a ABRACE adote todas as medidas ao seu alcance para evitar a propagação indevida da planta maconha e do extrato fabricado a partir dela. Para isso vai ser mantido um cadastro de todos os pacientes beneficiados, com necessidade comprovada. Para o cadastro também é exigido que se apresente o “documento de identificação pessoal do próprio paciente e do seu responsável, se for o caso; receituário prescrevendo o uso de produto à base de maconha; laudo demonstrativo de se tratar de caso para o qual já foram tentados, sem sucesso, todos os tratamentos registrados; e informações da quantidade de óleo recebida e das datas de cada entrega”.
A magistrada estabeleceu ainda que a Anvisa receba esse pedido de Autorização Especial no prazo de 45 dias. Ao falar sobre a evolução do uso medicinal da maconha, a magistrada federal fez o registro de decisões da 3ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal e da 1ª Vara da Paraíba, autorizando pacientes a importar tais produtos, o que ainda foi considerado um entrave para famílias carentes em virtude dos custos envolvidos. “O custo mensal pode superar R$ 1.000,00, valor que pode torná-lo inacessível para famílias de baixa renda”, afirmou ela.
Sobre os altos custos, a juíza citou que há ação na 3ª Vara Federal da Paraíba, em que se pede o pagamento desses produtos pelo SUS, mas a decisão favorável de 1º grau foi suspensa pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região. “Diante desse dilema, pais de crianças que já experimentaram bons resultados com o tratamento passaram a impetrar habeas corpus para obter salvo conduto a fim de cultivar a planta maconha em suas próprias residências”, concluiu.
Na análise do pedido, a juíza afirmou que tanto a autora ABRACE quanto a ANVISA e UNIÃO, reconhecem a permissão, na lei brasileira, do cultivo e da manipulação de plantas para fins exclusivamente medicinais e científicos. A dúvida é saber se esse direito já pode ser exercido no país.
Na defesa, a Anvisa argumentou que não há regulamentação para que seja concedida a autorização. Mas a magistrada entendeu a “alegação de falta de regulamentação da lei não permite afastar o exercício do direito por aqueles que necessitam dos produtos em questão para preservar sua saúde” e que, na ausência de norma administrativa mais específica, a Resolução 16/2014 da Anvisa “pode ser usada satisfatoriamente para analisar pedido de cultivo e manipulação da maconha para fins médicos, proporcionando o controle estatal da atividade sem sacrificar completamente as necessidades dos pacientes”. Para chegar a essa conclusão, a magistrada se fundamentou ainda nas convenções internacionais e na lei, que estabelecem expressamente a possibilidade de cultivo e manipulação de produtos contendo substâncias entorpecentes e/ou psicotrópicas com fins exclusivamente medicinais, dentre os quais os extraídos da maconha. “Essa previsão decorre do direito à saúde e da garantia da dignidade da pessoa humana, constitucionalmente assegurados”, ressaltou.
A juíza lembrou também que os produtos formulados à base da maconha cuja importação atualmente é admitida no Brasil não são classificados como “medicamentos” em seus países de origem, mas como suplementos e, por isso, um produto similar com fim medicinal que venha a ser fabricado no Brasil contendo essas substâncias não deve ser submetido a um controle mais rígido do que os importados. No processo, há inúmeras prescrições médicas, algumas delas acompanhadas de laudos descrevendo o quadro dos portadores das doenças. “Esses relatos não deixam dúvidas sobre a necessidade imediata de tais pacientes terem acesso aos extratos da maconha, de forma continuada, sem interrupção do tratamento. Demonstram também que o uso dessas substâncias tem sido a última alternativa terapêutica, buscada depois que todos os medicamentos registrados foram ineficazes para obter um controle satisfatório das crises e sintomas de suas doenças”, complementa.
Para a concessão da liminar, a magistrada considerou a urgência no pedido, para evitar descontinuidade no tratamento dos pacientes que já se beneficiam do óleo extraído da maconha manipulado pela ABRACE. “Caso futuramente se entenda impossível o cultivo e a manipulação da maconha pela autora, estes deverão cessar de imediato”, destacou.
G1 PB
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